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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2002 Sandra Field

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

Passado Obscuro, n.º 730 - Julho 2014

Título original: On the Tycoon’s Terms

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em português em 2004

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5399-7

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

www.mtcolor.es

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

Capítulo 16

Capítulo 17

Volta

Capítulo 1

 

– Luke! Fico contente por te ver, acabas de chegar?

– Olá, John – disse Luke MacRae e apertaram a mão. – Cheguei há uma hora. Em jet-lag como sempre – «e não me apetece estar aqui», pensou para si próprio, mas não podia dizê-lo a John. – E tu, quando chegaste?

– De manhã cedo... Há uma pessoa que quero apresentar-te, tem algumas propriedades na Malásia que talvez te interessem.

– No interior? – perguntou Luke. Tinha chegado a ser o dono de um aglomerado de empresas dedicadas às minas e graças ao seu carácter estenderam-se pelo mundo. John e ele eram dois dos delegados que participavam numa conferência internacional que se celebrava junto a um dos lagos de Manitoba.

– Terás que lhe perguntar a localização exacta – John chamou a empregada. – O que queres beber, Luke?

– Whisky com gelo – disse Luke e interrogou-se por que é que a empregada trazia uns óculos tão feios. Tinha a certeza que sem os óculos ficaria muito mais bonita.

Estava a manter uma interessante conversa com o homem malaio quando ouviu uma doce voz que lhe dizia:

– O seu copo, cavalheiro.

Luke decidiu que sua voz não combinava com os óculos que trazia nem com o cabelo loiro que se escondia debaixo de um chapéu branco. Adorava julgar as pessoas e raramente se enganava. Uma coisa era certa, não era o tipo de mulher que lhe chamava a atenção.

– Obrigado – disse ele e não voltou a pensar nela.

Três quartos de hora mais tarde, passaram todos para o refeitório. A sua mesa era a que tinha melhor vista para o lago e estava ocupada por algumas das pessoas mais importantes que tinham assistido ao congresso. Ele tinha aprendido a não se sentir demasiado satisfeito pelos acordos que conseguia. Era muito bom. Sabia isso, mas não pensava demasiado. O poder nunca lhe tinha interessado.

Poder significava segurança e a segurança era o contrário da infância que tinha tido.

Luke sentou-se à mesa e passou a mão pela nuca. Ele nunca pensava na sua infância e o facto de que Teal Lake, o lugar onde tinha nascido, estar perto de Ontário não era motivo para que ficasse sensível. A proximidade ao seu antigo lar era o motivo pelo qual não desejava estar ali. Embora lar não fosse a palavra adequada. Os seus pais não lhe tinham oferecido nada parecido a um lar no pequeno povo mineiro de Teal Lake.

Luke agarrou no menu e escolheu o que queria comer. Depois fixou-se nos restantes ocupantes da mesa.

A única surpresa estava justamente diante dele: Guy Wharton. A primeira vez que Luke o viu pensou que era o clássico homem que herdara uma grande quantidade de dinheiro, mas que não tem cérebro para o manejar. E a sua opinião não tinha mudado nos sucessivos encontros que tinha tido com ele.

O empregado começou a tomar nota dos pedidos e a empregada fez o mesmo no outro extremo da mesa. «A empregada de óculos feios e com uma bonita voz», pensou Luke. Guy tinha levado o copo para a mesa, mas mesmo assim, estava a pedir um whisky duplo e uma garrafa de bom vinho. Com os copos, Guy era terrível. Luke centrou a sua atenção no seu colega de mesa, um britânico encantador com um olfacto infalível para os negócios. Depois ouviu a doce voz novamente.

– Cavalheiro? Posso tomar nota do que deseja?

– Quero salmão fumado e cordeiro, bem passado – disse Luke. Ela concordou com educação e dirigiu-se ao seu colega de mesa. Não apontou o pedido e Luke reparou que, por detrás dos óculos, os seus olhos eram de um inteligente azul claro. Tinha a certeza que não se enganaria no pedido.

Era evidente que tinha que ser boa no seu trabalho, um lugar como aquele não contrataria pessoas inúteis.

Empregadas e Teal Lake... estava a perder o rumo dos seus pensamentos.

– Rupert, como pensas que vai ir a prata nos próximos dois meses?

O inglês começou a fazer uma valorização técnica e Luke dedicou-lhe muita atenção. Serviram um copo de vinho e bebeu um gole. Reparou que Guy já tinha o rosto corado e que falava demasiado alto. O salmão fumado estava extraordinário, o cordeiro, muito terno e a verdura estaladiça. Então, Luke reparou que Guy chamava a empregada. A rapariga aproximou-se de seguida. O uniforme preto e o avental branco que trazia escondiam a sua figura, mas não podiam esconder o seu orgulho. Não era uma mulher alta, embora caminhasse como se fosse, como alguém que sabe quem é e que tem segurança em si própria.

– Tinha pedido o filete mal passado e está quase cru – disse Guy.

– Lamento muitíssimo, senhor – disse ela. – Vou devolvê-lo à cozinha e trago outro como o senhor deseja.

Mas quando se preparava para recolher o prato, Guy agarrou-a pelo pulso.

– Por que é que não o fez bem na primeira vez? Pagam-lhe para trazer o que eu lhe peço.

– Sim, senhor – disse ela. – Se me soltar, garanto que lhe trazem o filete imediatamente.

Luke reparou que a rapariga tinha a cara um pouco vermelha e que o seu corpo estava tenso. Mas Guy não a largou. Torceu-lhe o pulso e olhou para ela.

– Deverias tirar esses malditos óculos – disse-lhe. – Nenhum homem no seu perfeito juízo se fixará em ti enquanto os usares.

– Por favor, largue-me o pulso.

Desta vez, não o chamou por senhor. Sem pensar, Luke levantou-se e disse num tom cortante:

– Guy, já ouviste a senhora. Larga-a. Agora – e reparou que o empregado chefe se aproximava à mesa.

– Apenas estava a brincar – disse Guy e acariciou a palma da mão da rapariga. Depois de largar o pulso. A empregada retirou o prato e afastou-se da mesa sem olhar para Luke.

– Não achei piada – disse Luke com frieza. – E tenho a certeza que os restantes também não. Incluindo ela.

– Por favor, é apenas uma empregada. E todos sabemos o que procuram.

Luke tinha a certeza que a empregada dos óculos feios não andava à procurava de nada nem de ninguém. Se ele fosse ela, teria usado lentes de contacto para mostrar os seus lindos olhos. Virou-se para olhar para o homem que estava sentado ao seu lado. Um italiano dedicado às minas de ouro. Minutos mais tarde, o empregado chefe aproximou-se à mesa com outro filete.

– Diga-me se não gostar, senhor – disse com muita educação.

– A empregada ficou com medo, certo? – perguntou Guy.

– Desculpe, senhor?

– Já ouviu – disse Guy. – Sim, este está muito bem.

Com a faca na mão enquanto falava, começou a contar uma história ao seu colega de mesa.

Quando acabaram, a empregada recolheu os pratos. Trazia uma etiqueta com o seu nome pendurado no casaco. Chamava-se Katrin. Luke tinha lido que o hotel estava próximo de um povo que tinha sido colonizado há cem anos por imigrantes islandeses, e ela, com o cabelo loiro e os olhos azuis, devia ser uma descendente daqueles colonizadores. Quando se inclinou para recolher o prato, reparou que Guy lhe tinha deixado uma marca no pulso. Experimentou um sentimento de raiva desproporcionado.

Por que é que sempre tinha desprezado os homens que se aproveitavam dos mais débeis? Porque a justiça era um dos seus princípios básicos que aplicava indistintamente a todas as classes sociais?

Ele não disse nada, a mulher já lhe tinha deixado bem claro que não estava agradecida pela sua intervenção. Não lhe apetecia comer sobremesa, por isso pediu um café.

– Acompanhas-me com um brandy? – murmurou John.

– Não, obrigado – respondeu Luke. Estou muito cansado, por isso dentro de muito pouco vou dar o dia por terminado.

Luke nunca tinha bebido em excesso, no entanto, o seu pai bebia por cinco homens. Por esse motivo os comentários de Guy afectavam mais Luke. John e ele falaram sobre o estado do mercado do cobre e do níquel e, depois, Luke observou como Katrin se aproximava com uma bandeja carregada de doces. Deixou-a com cuidado no carrinho e repartiu as sobremesas sem fazer uma pausa. «Tem muito boa memória e é extremamente eficiente», pensou ele com admiração.

Guy tinha pedido um brandy duplo e quando ela se preparava para o deixar em cima da mesa, tocou-lhe, de propósito, o peito com o braço.

– Mmm... que bem – disse com desdém. – Escondes mais alguma coisa por debaixo desse uniforme?

Luke reparou que o fogo invadia o olhar de Katrin. De repente, observou o copo a cair e o líquido a entornar-se por cima da manga da camisa de Guy.

– Oh, senhor – exclamou ela, – sou tão descuidada. Permita-me que lhe traga um guardanapo.

Guy levantou-se com o rosto marcado pela ira e Luke fez o mesmo. «Ela fez de propósito», pensou Luke.

– Guy – disse com um tom suave, – se causas mais problemas nesta mesa, encarregar-me-ei pessoalmente de que o tratamento que estás à espera com Amco Steel seja um fracasso. Ouviste?

Fez-se um curto silêncio. Guy queria ter o melhor tratamento possível, à semelhança de todas as pessoas que estavam na mesa.

– És um bastardo, MacRae – disse Guy.

Na realidade, Guy estava a dizer a verdade. O pai de Luke não se tinha incomodado em casar com a sua mãe, mas ele não se deixava afectar pelas circunstâncias do seu nascimento.

– Farei com que o tratamento seja suspenso antes que chegues à mesa das negociações – disse. – Agora, senta-te e comporta-te.

Katrin tinha tirado um guardanapo da estante inferior do carrinho. Quando se levantou, olhou para Luke como se lhe dissesse que não precisava da sua ajuda. E deu o guardanapo a Guy.

– O hotel ocupar-se-á de lhe levar o traje à lavandaria, senhor – disse ela com toda a tranquilidade e continuou a servir as sobremesas como se nada tivesse acontecido.

Luke deixou a chávena do café em cima da mesa e disse:

– Boa noite a todos. São duas da madrugada e vou dormir. Vejo-vos pela manhã – ao sair do refeitório, deteve-se para falar com o empregado chefe. – Espero que não levante problemas à empregada pelo que aconteceu na nossa mesa – disse. – Se estivesse a trabalhar para mim, o senhor Wharton, estaria a ser acusado por assédio sexual.

O empregado chefe, que devia ter cerca de vinte e oito anos, menos cinco que Luke, disse:

– Obrigado, senhor. Tenho a certeza que o senhor Wharton não causará mais problemas.

– Se despedem a empregada ou a repreendem de alguma maneira, vou queixar-me à administração.

– Não será necessário, senhor.

De repente, Luke sentiu-se cansado. Por que estava a perder tempo com uma mulher que não queria a sua ajuda? Decidiu que o melhor a fazer seria deitar-se e dirigiu-se para o elevador.

Na cama. Sozinho. Como há muito tempo.

Quando regressasse a São Francisco, tinha de fazer algo para solucionar o problema.

Capítulo 2

 

Luke dormiu muito bem naquela noite. Acordou cedo e foi correr. Depois regressou ao seu quarto, tomou um duche e vestiu-se. Vestiu o casaco e colocou uma gravata de seda antes de passar o pente pelo cabelo moreno. Tinha sido cortado na semana anterior em Milão, mas não conseguia evitar o seu crescimento. Olhou para o espelho e observou os seus olhos castanhos. Eram tão escuros que pareciam pretos. Tinha o mesmo aspecto de sempre: bem arranjado, decidido e com tudo sob controlo.

Não estava mal para um rapaz de Teal Lake.

Luke fez uma pausa. Não queria pensar em Teal Lake. Nem nesses momentos, nunca. Então, por que é que estava ali de pé a olhar para o espelho em vez de descer? De certeza que podia fazer bons contactos nos próximos dias.

Entrou no elevador e desceu até à entrada. O refeitório tinha umas janelas enormes, emolduradas em cortinas de veludo e uma magnífica chaminé, rodeada de quadros que representavam o trigo da zona. Era meados de Julho, o lago estava calmo e o céu azul.

«Gostaria de estar ali», pensou Luke enquanto capturava a imagem do céu azul com a sua câmara digital.

Mas, não era o momento, tinha coisas mais importantes a fazer. Quando se dirigiu para a sua mesa, Katrin, a empregada saiu da cozinha. Estava vestida com uma saia do estilo camponês e uma blusa bordada.

– Bons dias, Katrin – disse Luke, animado.

– Bons dias, senhor – respondeu ela sem vacilar.

Em três palavras deixou bem claro que estava a ser amável com ele porque era parte do seu trabalho. Luke achou a situação engraçada. Tinha sido insultado várias vezes durante a vida, quando era jovem e trabalhava nas minas do Árctico, como quando se converteu num empresário, mas nunca o tinham feito com tanta subtileza. Nem uma palavra fora de lugar.

Teria gostado de lhe arrancar os horríveis óculos que trazia.

Quando chegou à sua mesa, Guy não estava. «Melhor», pensou Luke e sentou-se de costas para o lago. Não queria olhar para a água. Tinha de trabalhar.

E foi isso que fez durante todo o dia. Serviram um buffet na sala de conferências. Katrin não estava em nenhum lado. Antes de comer, Luke entrou no ginásio para fazer exercício. Estava contente como lhe corriam os negócios. Na Malásia tinha tudo sob controlo e sentia que tinha que ser precavido com um negócio nas minas de Papua Nova Guiné. Há muito tempo que tinha aprendido a confiar no seu instinto. E este dizia-lhe que deveria ter cuidado.

Uma hora mais tarde, Luke sentia-se mais descansado e dirigiu-se ao refeitório. Cruzou-se com uma mulher elegantemente vestida que olhou para ele de cima a baixo e lhe sorriu. Luke estava acostumado porque acontecia com frequência. Sorriu com educação e continuou o seu caminho.

Enquanto esperava pelo empregado chefe, interrogou-se por que é que atraía as mulheres. Estava vestido com um fato feito à medida e com uns sapatos italianos, o que indicava que tinha dinheiro. Mas havia muitos outros homens assim vestidos. Por isso, não era apenas pelo seu dinheiro.

Talvez fosse por ser um homem alto e atlético, com um rosto atraente, talvez pelo seu olhar enigmático e o seu sorriso singular.

Foi o último a chegar à sua mesa. Katrin trazia novamente o uniforme preto e, pela primeira vez, Luke reparou que tinha o cabelo loiro apanhado por debaixo do chapéu. «Se o soltasse ficaria por debaixo dos ombros», pensou Luke.

– O que deseja beber, senhor?

– Whisky com água, sem gelo, por favor.

– Está bem, senhor.

Luke interrogou-se em que momento a educação se convertia em paródia. E decidiu que Katrin conhecia o ponto exacto, mas não queria utilizá-lo. Sentou-se.

Enquanto fazia pesos no ginásio pensou que Katrin lhe fazia lembrar alguém. Repassou todos os habitantes de Teal Lake e chegou à conclusão que ela não era daquele lugar. Então, onde a tinha conhecido?

Uma vez mais a comida estava extraordinária. Uma vez mais, Guy bebia vinho como se fosse água e engolia a comida.

Conversaram sobre os caprichos do mercado de valores. Guy fez um par de comentários que valia a pena ouvir. Enquanto Katrin lhes servia o café, Guy disse com exagerada cordialidade:

– Bem, Katrin, imagino que não tenha vontade de investir o teu dinheiro, mas se o fizesses, comprarias fundos de Alvena?

– Não saberia dizer-lhe, senhor.

– Claro que não – disse Guy. – Tentemos com algo mais próximo ao teu nível. Compras uma carteira de acções? São para as pessoas que não sabem nada de nada sobre o mercado... É como investes o teu dinheiro?

Durante um instante, ela hesitou como se estivesse a tomar uma decisão. Depois, olhou para Guy e disse:

– Uma carteira de acções não é uma má estratégia. Quando uma pessoa entra no jogo do mercado sabe que, embora tenha cuidado, vai sempre perder algo. Por isso, escolha o que escolher há sempre a possibilidade de ganhar o suficiente para compensar as perdas. – sorriu. – Está de acordo comigo, senhor? – Guy ficou corado.

– Este café parece que é de ontem – queixou-se.

– Prepararei um novo, senhor – respondeu ela. Retirou a chávena e dirigiu-se à cozinha. Caminhava da mesma maneira como tinha chamado a atenção de Luke no dia anterior.

– Esta mulher não devia ser empregada... – murmurou Luke. – E quais são as perspectivas para S&P nos próximos seis meses, Guy?

Durante um momento, pensou que Guy ia lançar-se sobre ele e ficou tenso. No entanto, Guy murmurou algo sobre as baixas percentagens e a conversa regressou a um tema normal. Luke bebeu outra chávena de café e foi o último a ir-se embora do refeitório, aproveitando para sair no mesmo momento em que Katrin começava a limpar a mesa. Colocou-se atrás dela e disse-lhe:

– Seria uma lástima que tivesses que vender as tuas acções, Katrin, mas se te dedicas a entornar o brandy por cima de todos os clientes que te ofendem acabarás por perder o teu trabalho.

Ela voltou-se para o ver.

– Não sei ao que se refere, senhor.

– Ontem à noite, entornaste o brandy por cima do Guy Wharton de propósito.

– Por que é que ia fazer tal coisa? As empregadas não fazem essas coisas.

– Então, tu és a excepção que confirma a regra. Oxalá tirasses esses óculos... assim poderia fazer uma ideia de como te sentes.

– Os meus sentimentos ou a falta deles, não são assunto seu... senhor.

– Também gostaria que parasses de me chamar senhor.

– São as normas da casa – disse ela com frieza. – Outra é que os empregados não lidam com os clientes. Por isso, peço desculpa, tenho trabalho a fazer.

– É uma pena que estejas num trabalho como este, és muito mais inteligente.

– É o trabalho que escolhi, é isso... a minha escolha. Boa noite, senhor.

Katrin voltou-se e Luke compreendeu que a conversa tinha acabado.

– Se pensas investir, não o faças em Scitech... está de rastos. Boa noite, Katrin – e justamente quando estava a dar a volta, acrescentou. – Sabes, tenho a sensação que me lembras alguém e não sei quem – não tinha pensado dizer-lhe, antes de saber quem lhe lembrava.

Ela ficou imóvel, como uma presa que enfrenta um predador. Baixinho, comentou:

– Engana-se. Nunca nos vimos.

A sua voz estava tensa. Assim como a sua postura. Havia algo misterioso nela. Não trazia aqueles horríveis óculos para esconder a sua feminilidade, era uma espécie de disfarce. Katrin não queria que a reconhecessem.

– Agora não sei onde te vi... mas tenho a certeza que me lembrarei – os dois copos de vinho que Katrin levava nas mãos caíram ao chão. Um deles partiu-se ao bater no pé de uma mesa. Katrin baixou-se para recolher os cristais. – Cuidado – exclamou Luke, – podes cortar-te.

Agarrou um guardanapo e ajoelhou-se junto de Katrin.

Envolveu os pedaços de cristal no tecido. O aroma delicado do seu corpo invadiu o seu olfacto. Reparou que ainda não tinham desaparecido as marcas do seu pulso.

– Por favor, vá-se embora – disse ela. – Eu limpo isto. Recolheu um cristal e fez um pequeno corte no dedo. Ao ver o sangue, Luke disse:

– Katrin, deixa isto. Levanta-te.

Agarrou-a pelo ombro e levantou-a. Depois, observou a ferida.

– Cuidado, está a magoar-me.